Diretor: Vitor Aleixo
Ano: XII
Nº: 626

1973-2023: De Alcáçovas a Mucumbura Voltar

No último dia 9 de Setembro teve lugar na localidade alentejana de Alcáçovas, no Monte do Sobral, uma “celebração da memória” de um acontecimento histórico que há cinquenta anos teve lugar naquela localidade: ali se reuniram em 9 de setembro último, além de elementos dos órgãos de soberania, um grupo ainda relativamente numeroso de militares e de ex-militares que, com muitos outros, lá se tinham  reunido, no maior sigilo possível e certamente rodeados dos necessários cuidados conspirativos, em 9 de Setembro de 1973, para criarem o “Movimento dos Capitães”, mais tarde MFA, que haveria, em 25 de Abril de 1974, de desencadear um forte, bem organizado e pacífico, movimento político-militar que derrubou uma Ditadura velha de outros cinquenta anos, e pôs fim, pouco depois, à Guerra Colonial que grassava nas Colónias portuguesas de África desde praticamente o início da década de 1960.

Foi, de facto, uma celebração ou, se quisermos, uma comemoração de um facto histórico, que poderíamos, se quiséssemos, com toda a propriedade,  denominar de facto histórico «fundador», porque ali se criou, se fundou, um movimento que iria irromper pela História, tendo como destino …  fazer História. Uma celebração/comemoração marcada, certamente, pela satisfação, pela alegria, revividas cinquenta anos depois de um dever cumprido: a devolução, pelos militares dos três ramos, da Democracia aos portugueses. Há, felizmente, na longa História Humana, muitos momentos destes, em que a satisfação, o regozijo e mesmo a festa têm lugar e encontro marcados entre os humanos. É o encontro dos homens e das mulheres com a História, comemorativa, festiva.

Mucumbura, Moçambique, 1973.

Há, contudo, na mesma História, momentos que não dá para comemorar e muito menos para celebrar. São os momentos dolorosos da dor, da humilhação e do opróbrio, perpetrados sobre os nossos irmãos,  pelos que vieram ao mundo e neste estiveram ou estão como agentes do mal, fautores do crime, sobre os oprimidos, os inocentes e sobre os que mais não querem do que o reconhecimento da sua condição de seres humanos, sujeitos de direitos, livres e soberanos. Neste ano de 2023, enquanto comemorávamos a criação do Movimento dos Capitães em Alcáçova, temos de rememorar, não comemorar, um acontecimento que mancha a nossa História de Povo pacífico e bom.

Mucumbura é uma pequena localidade pertencente á província de Tete, em Moçambique. Foi lá que também há cinquenta anos, entre os meses de Maio e de Novembro de 1973, as tropas portuguesas, a mando das suas chefias civis e militares, usando competentes armas destrutivas, massacraram até à morte cerca de 400 civis de Mucumbura, na sua maioria mulheres e crianças. Foram quatro os massacres, planeados com requinte de violência e realizados com toda a gama de sevícias martirizantes. Sim, ficou na História: dos povos africanos de Moçambique e também na História de Portugal.

Dois acontecimentos ligados por um único fio: o da Memória! Para que não os esqueçamos.

- 19 set, 2023