Diretor: Vitor Aleixo
Ano: XI
Nº: 587

Costa contra Costa? Não será antes a “arte” do engano? Voltar

António Costa, falando na qualidade de Secretário-Geral do PS num congresso da tendência “sindical” socialista, disse, sem se rir: “só através de aumentos salariais será possível combater a inflação”. E disse ainda: “Até pode ser o crescimento da economia a fazer aumentar salários, mas é também pelo aumento dos rendimentos que a economia cresce”.

A gente lê e ouve e não pode deixar de pensar que estas afirmações do Costa Secretário-Geral do PS só podem ser um “ataque” duro e forte ao Costa primeiro-ministro. Ou será que estamos perante o velho ditado “olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço”?

É que o Costa Primeiro-Ministro e o seu ajudante Medina no processo da negociação para os aumentos salariais da Administração Pública e do Salário Mínimo Nacional, já quando a inflação era escabrosa, disseram: "A nossa política salarial é a política adequada para responder às necessidades de assegurar o poder de compra durante o ano de 2023, sem com isso contribuir para um aumento das tensões inflacionistas no nosso país".

As afirmações de Costa (já não sei se secretário-geral do PS, se primeiro-ministro) não se ficam por aqui. Leiam: "… não vamos é embarcar em medidas de ilusão onde rapidamente os aumentos são consumidos pela inflação. Temos mesmo de travar a inflação e não multiplicá-la numa espiral que depois ninguém sabe com é que se controla"; "Não podemos embarcar na ilusão de que só se controla os preços com aumento de rendimentos".

Foi com esta lógica (que se provou ser da batata) que Costa Primeiro-Ministro e o seu ajudante Medina celebraram/brindaram com as confederações patronais e com a ugt, a assinatura do pomposamente chamado Acordo de Médio Prazo de melhoria dos rendimentos, dos salários e da competitividade”. Acordo que, e muito bem, a CGTP-IN se recusou assinar, pois, como o tempo prova, o mesmo apenas serviu para dar milhões ao capital e perda de poder de compra aos trabalhadores. Veja-se que já em 2022 o peso dos salários no Produto Interno Bruto (PIB) baixou em relação a 2021 e este (o peso), como também sabemos, já há muito era baixo e é dos mais baixos da União Europeia.

Note-se que o processo inflacionista que estamos a ter é diferente de outros e noutras alturas, pois este resulta da especulação criminosa de preços. Dizem-nos que a inflação, que está nos 7,4% em Março, desce em décimas que não se notam, mas os preços dos bens alimentares aumentam próximo dos 20% e os custos com habitação (rendas e prestações) são incomportáveis. Assim, aquilo que é determinante para a nossa sobrevivência aumenta muito mais que os restantes produtos e isso é terrível para quem vive do seu salário e da sua pensão de reforma. Por outro lado, quando se fala em diminuição da inflação não se está obrigatoriamente a falar de baixa de preços. Até acontecer que nos próximos meses a inflação baixe muito e mesmo assim os produtos estarem mais caros do que em 2022. Sabemos que, em regra, o preço que aumenta dificilmente diminui, quando muito mantém-se.

A prova mais provada do que afirmo é que Costa primeiro-ministro, não podendo esconder por mais tempo a derrota da tese sobre o peso dos salários e pensões na subida da inflação e perante a pressão e a luta, veio apresentar medidas a que, pomposamente (Costa é um pomposo do marketing), chamou de "medidas de resposta ao aumento do custo de vida", onde prevê um pífio e insuficiente aumento de 1% para os trabalhadores da Administração Pública, esquecendo os do privado e os reformados e aposentados, dizendo que não cabe ao governo aumentar os salários dos trabalhadores do sector privado, pois isso é competência das empresas. Mas vamos lá ver:

Porque não promove a revisão do “acordo” para aumento dos salários todos e não desbloqueia a negociação colectiva, quando foi Costa quem celebrou/assinou o “acordo” com os patrões e quando está provado que a inflação está acima do que eles disseram e os salários estão degradados?

Porque não aprova um aumento intercalar do Salário Mínimo Nacional, quando este é fixado pelo Governo?

Porque não decreta o aumento das pensões e reformas, quando os reformados e aposentados já tiveram um corte nas pensões em 2023?

Porque é que Costa primeiro-ministro não faz o que Costa secretário-geral do PS diz? Porque não é coerente? Porque Costa diz o que não pensa e pensa o que não diz. Por isso, as palavras do Costa secretário-geral do PS só podem ser lidas e ouvidas como demagogia e conversa de ocasião para enganar, desde logo aqueles a quem se estava a dirigir e lhe bateram palmas. Nestes momentos lembro-me, ainda com mais saudade, do Kalidás Barreto, do Adelino de Carvalho, do Ruben Rolo, do Fernando Loureiro, do Luís Vilas Boas, do Jerónimo Rodrigues e muitos outros notáveis e bons sindicalistas militantes do PS que passaram pela CGTP-IN.

- 13 abr, 2023