Diretor: Vitor Aleixo
Ano: XI
Nº: 587

Só há liberdade a sério quando houver paz, pão, trabalho, habitação, saúde, educação, cultura! Voltar

O título deste artigo faz parte da canção de Sérgio Godinho e lembrei-me da canção porque paz, pão, trabalho, habitação, saúde, educação, cultura constituem direitos sociais inscritos na Constituição da República que, concretizados, possibilitariam o desenvolvimento económico e social do nosso país e seriam condição essencial para a liberdade e a democracia plenas e não apenas para as formais e amputadas que hoje temos.

Quem, como eu, tenha uma visão progressista e de esquerda da sociedade sabe que a liberdade e a democracia só existem e serão exercidas na plenitude, se todos tiverem direitos sociais e se o trabalho e os trabalhadores forem valorizados. É que a liberdade e a democracia não são, não podem ser, apenas e só o direito a falar e a votar de quatro em quatro anos.

É que:

Não tem verdadeira liberdade de expressão quem defende a paz contra a guerra e é ostracizado e ou censurado por isso.

Não tem liberdade uma pessoa ou uma família (e são cada vez mais em Portugal) que não têm dinheiro para a alimentação e que muitas vezes têm de escolher entre comida e medicamentos e que tem de optar entre ele(a) e os filhos. Essa(s) pessoa(s) não têm liberdade nem para falar, nem para escolher, pois entre esta e o estômago é obrigado a escolher este. Sobre isto, não posso deixar de denunciar a hipocrisia dos direitistas, dentro e fora do governo, que, para manterem intactos os interesses imorais, ilegais e ilegítimos dos especuladores, acham que o problema da especulação nos preços dos bens alimentares se resolve com mais apoios sociais do Estado pagos por todos nós, quando, como qualquer ser inteligente sabe, a solução passa por aumentar os salários e as pensões, estabelecer preços de referência nos produtos e acabar com os lucros obscenos obtidos à custa da miséria de um povo.  

Não tem liberdade para falar e para exercer os seus direitos individuais, colectivos e sindicais o trabalhador que tem um contrato precário, ou que aufere salários miseráveis e que está sujeito a discriminações, pressões e chantagens.

Não há liberdade a sério quando há patrões que acham que nas empresas não entra a democracia, prevalecendo o quero, o posso e o mando e impedindo a realização de plenários sindicais, a distribuição e afixação de informação sindical e não permitindo o contacto dos dirigentes e delegados sindicais com os trabalhadores dentro das instalações da empresa. Quando assim é o que há é ditadura de cariz fascista. É que, a democracia não pode, e não deve, ficar à porta das empresas.

Não tem liberdade quem não tem habitação condigna e a preço acessível para viver e está exposto ao despejo, já que as rendas de casa atingem preços absolutamente escandalosos, obscenos e especulativos e se estiver a pagar empréstimos para aquisição de casa própria é assaltado pela banca sanguessuga que, com a conivência do governo, lhe aplica aumentos da prestação que atira muitas pessoas/famílias para a rua, para a indigência e para situações de pobreza extrema.

Não, Sr. comentador Marcelo (que às vezes faz de Presidente da República), a habitação não é um melão que se serve às talhadas e não, não há só propostas do governo e do PSD, também há do PCP e do BE! A habitação é um direito inteiro que incumbe ao estado assegurar.

Lembro que o Artigo 65.º da Constituição da República determina que  todos têm direito a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar e que para assegurar este o direito, incumbe ao Estado: i) promover … com as autarquias locais, a construção de habitações económicas e sociais; ii) estimular a construção privada, com subordinação ao interesse geral…; iii) fomentar a criação de cooperativas de habitação e a autoconstrução. E determina ainda que o Estado deve estabelecer que a renda é compatível com o rendimento familiar e de acesso à habitação própria.

E sim: não há liberdade a sério para quem não tem acesso à saúde devido à degradação premeditada do SNS para fazer crescer o negócio dos privados, para quem vê negado o direito à educação, porque é forçado a abandonar a escola e se vê afastado do ensino superior por insuficiência financeira das famílias, para quem não tem direito à mobilidade porque as portagens e os transportes públicos o não permitem e para quem é negado o direito à fruição e criação culturais.

Que faz António Costa, o seu governo e a sua maioria na Assembleia da República? Assobia para o lado, faz de conta que anda sem andar e usa a política do engano. É por isso que cresce o protesto e a luta e é por isso que já se grita “Costa escuta, o povo está em luta” e se isto continuar podemos vir a gritar coisas mais duras e fortes, como por exemplo: “Com a nossa luta as maiorias também se abatem”.

- 22 mar, 2023