Diretor: Vitor Aleixo
Ano: XI
Nº: 587

O fim das portagens e a responsabilidade dos eurodeputados Voltar

E foi na última semana, agora já sem grande pompa e circunstância, que os jornais noticiaram o chumbo do fim das portagens pelo parlamento. O cansaço também afeta as notícias, e tantos são os chumbos, que a questão das SCUT nas autoestradas do interior já começa a ser uma não-notícia.

Até a redução dos valores das portagens, e não a sua mera eliminação, que no ano passado tinha sido atirada para os termos da aprovação do orçamento de estado para 2023, ainda não foi aplicada. Recordemos que está prevista, em sede de orçamento de estado, uma redução do valor das portagens em 50% para territórios do interior. Já entrou o mês de março e continuamos sem ver a dita redução executada. E a cada mês que passa estes territórios vêm-se mais uma vez penalizados pelos custos da mobilidade.

Em 2024, daqui a um ano, estaremos em plena reta de preparação para as eleições europeias. Nestas eleições escolheremos os novos eurodeputados. A pergunta que se impõe é, se o fim das portagens foi recentemente re-chumbado pelo parlamento nacional, o que têm os futuros, e atuais, eurodeputados a ver com o assunto?

Bom, e é aqui que a porca torce o rabo! As autoestradas nacionais tiveram uma enorme comparticipação de fundos comunitários. E um dos objetivos desses fundos é tornar os territórios onde são aplicados mais competitivos, melhorando a sua economia e fixando pessoas. Como diversos estudos vêm demonstrando a introdução de portagens faz precisamente o contrário. E convém aqui recordar que o orçamento europeu, de onde vêm os fundos comunitários, é aprovado também pelo parlamento europeu. 

No trabalho No. 2080 do Kiel Institute for the World Economy, um estudo feito de forma muito rigorosa, demonstram-se cientificamente várias coisas sobre o impacto das portagens nos territórios. A mais clara e taxativa é a de que impor portagens tem um efeito nefasto sobre a capacidade de gerar empresas e afasta totalmente as de maior dimensão de se instalarem. Sobre este assunto temos aqui experiência própria, infelizmente uma má experiência. Portanto, a introdução das portagens em autoestradas inicialmente previstas como não portajadas, as SCUT, que poderia justificar-se durante um curto espaço de tempo por razões de crise orçamental aguda, tem vindo a impor um custo substancial no todo da economia dos territórios do interior do país. Mas, reconhecido que está o efeito positivo destas autoestradas na economia, o que deveria ter sido feito era uma eliminação ou, quando muito, um custo simbólico de portagem. E é sobre este assunto que os senhores eurodeputados, atuais e futuros, se devem de pronunciar.

Em boa verdade temos visto, para o melhor e para o pior, todos os partidos a nível nacional a pronunciarem-se sobre o tema, e os deputados da assembleia da república têm tomado decisões sobre a matéria, mas seria bom que o parlamento europeu, e os seus parlamentares, também tomassem parte nesta discussão. Afinal, os fundos comunitários é suposto serem utilizados para fazer crescer as regiões mais frágeis e não para as enterrar ainda mais. 

É altura de os atuais e futuros eurodeputados, e putativos candidatos, tomarem partido nesta discussão, e ajudarem a resolver o problema. A europa das regiões, tão propagandeada em diversas ocasiões, tem de ser assumida na sua plenitude. Em alternativa, manter as SCUT com portagens, é estar a garantir que os territórios vão manter-se longe do desenvolvimento. As alterações climáticas estão aí todos os dias, e as suas consequências sobre o ambiente, e a sua desertificação, estão bem claras. E meio mundo anda aflito com elas. Mas, visto de outro ponto de vista, continuar a cobrar portagens nas SCUTS é ajudar a garantir que os territórios continuarão a desertificar-se em termos humanos. As alterações humanas são aqui promovidas, de forma negativa, pela aplicação de portagens que garantem a contínua desertificação dos territórios do interior de Portugal. É isto que queremos?

- 07 mar, 2023