Diretor: Vitor Aleixo
Ano: XI
Nº: 587

“Quem tem um porquê para viver pode suportar quase todos os comos “ Voltar

Todos nós já ouvimos uma frase que se tornou um clichê que diz "a esperança é a última coisa que se perde". Geralmente aceitamos calorosamente a mensagem e até damos o nosso polegar para cima, mas sabemos por que é a última coisa que realmente nos resta? Nesta ocasião, gostaríamos de refletir sobre esse conceito de esperança, entendendo-o não como um placebo em tempos de autoajuda e de circulação de frases estimulantes nas redes sociais, mas como um elemento de nossa existência que é vital para dar plena significado para nossas vidas finito.

Para entender a origem do dito ditado, devemos nos referir momentaneamente à mitologia grega, particularmente ao mito da caixa de Pandora. Lembremo-nos por um momento de Prometeu, o titã amigo dos mortais por ter roubado o fogo dos deuses e no-lo dado para nosso uso. É claro que tal presente não era gratuito, e o titã recebeu o castigo divino por meio de uma figura feminina, criada especialmente para seduzir qualquer mortal:

Efesto se encarregou de moldar uma figura perfeitamente sugestiva com argila; Atena a cobriu elegantemente com roupas finas e atraentes e Hermes incutiu nela a facilidade de seduzir e manipular. Foi Pandora quem, após receber a vida pelo sopro de Zeus, foi enviada à terra dos homens com uma caixa misteriosa que não deveria ser aberta. Eventualmente, Prometeu, apesar de estar ciente dos possíveis perigos que corria por ter desonrado os deuses, não pode deixar de se apaixonar perdidamente pela preciosa criação de Deus. Tendo-se unido a Prometeu, Pandora não suportou sua curiosidade e decidiu abrir a caixa que Zeus havia convenientemente deixado para ela. Dela emergiu uma série de males que assolariam e atormentariam o mundo: o mal e a ambição aparecem na existência terrena. Ao tentar fechar a caixa, a bela criação dos deuses percebeu a presença de um pequeno exemplar, um pássaro, que representaria o que resta no fundo do cubículo que continha tantas desgraças: é uma representação alegórica da esperança.

Depois de completar o ciclo do calendário gregoriano, podemos apreciar que um "bom estado de espírito" circula sem cessar, sustentado pelo desejo de renovação das esperanças para o próximo ano. Embora a sensação de renovação seja certamente boa, o que ela realmente muda? A respeito do referido mito, o filósofo alemão Friedrich Nietzsche interpretou que a esperança, longe de ser um "bem" remanescente em meio a tanta miséria, é em si o pior dos males, pois não faz senão prolongar o estado de sofrimento. Homens. Nesse caso particular, o pensador alemão estaria destruindo a noção de “espera” sem ação através, sem conhecimento intercessor e sem vontade concreta de mudança de poder (seu problema é contra a espera irracional que prolonga situações insuportáveis, totalmente evitáveis).

Diante do exposto, é necessário refletir por um segundo sobre o sentido de nos perguntarmos "por que isso acontece comigo?", reflexão recorrente toda vez que a vida nos dá um daqueles tapas na cara que nos fazem tremer. Bem, meus amigos, diante de tamanha preocupação, a contrarresposta é "por que isso não dever-me-ia tocar?", filtrada pelo fato de que devemos ser críticos ao discurso existencialista niilista que nos vendeu a ideia de que devemos aceitar e suportar com coragem heroica o suposto absurdo absoluto de nossas vidas (Sartre) e pensar que talvez o saudável aceitar seja nossa própria incapacidade de reconhecer significados supremos que excedam nosso caprichoso desejo pessoal e individualista de existir de uma certa maneira.

É verdade que nossa capacidade de ação é finita e limitada, pois nunca estamos completamente livres de condicionamentos biológicos, psicológicos, econômicos ou sociológicos. Ainda assim, é fundamental entendermos que o poder da esperança está na liberdade última e suprema, intransferível e impossível de romper, que não é outra senão a liberdade de escolher com que atitude enfrentaremos tais cenários que ultrapassam nossa vontade: Como reagimos às condições que não podem ser mudadas depende de nós pura e exclusivamente pela convicção de que se não podemos mudar a situação, sempre teremos o livre poder de construir nossa integridade diante dela. Claro, é difícil, mas não vale a pena tentar?

- 22 fev, 2023