Diretor: Vitor Aleixo
Ano: XI
Nº: 587

Boa governança municipal Voltar

O estudo da governança tem-se desenvolvido nas últimas décadas, impulsionado pelos trabalhos de agências internacionais, especialmente pelo Banco Mundial.

Governança é um termo com forte conotação positiva sendo um conceito mais amplo e inclusivo do que apenas “governo” e envolve a direção da sociedade por meio de redes e parcerias entre governos, empresas e associações da sociedade civil e transcende as tensões e contradições como público versus privado, ou burocracia versus mercado.

O conceito de governança como boa governança encontra-se ligado à reforma do Estado, e envolve um serviço público eficiente e uma administração responsável pela aplicação dos fundos públicos. A boa governança remete para elementos nucleares daquilo que pode ser considerado uma boa administração, especialmente quando se tem por base a participação, a responsabilização e a transparência num Estado Democrático de Direito. A administração municipal enquanto patamar de maior proximidade entre os eleitos e os cidadãos, por maioria de razão, não pode deixar de denotar a observância e o cumprimento dos preceitos constitucionais vinculantes à administração pública.

A organização administrativa do Estado remete para os municípios como entes dotados de autonomia política, administrativa, financeira e auto-organizatória que o processo de descentralização em curso vem robustecer.

Assim, a administração municipal desfruta de um considerável espaço de liberdade para a elaboração e implementação de políticas públicas. Este espaço próprio do desenvolvimento de cada municipalidade é que permite analisar e avaliar cada ente local em vista da boa governança, o que deve compreender as suas três dimensões fundamentais, sempre com foco no desenvolvimento: democracia participativa, transparência e accountability ou responsabilização.

Quanto à dimensão da democracia participativa, o espaço local constitui-se em lugar de excelência para a participação ativa dos cidadãos nos negócios que lhe dizem respeito. Neste sentido, perscrutam-se as instâncias de participação e controle da população na atuação estatal. Os municípios podem instituir na sua ação os mais diversos instrumentos vinculantes (referendos locais e orçamentos participativos, entre outros) e não vinculantes (sessões de câmara e assembleias municipais, conselhos consultivos, conselhos de cidadãos, consultas públicas e audiências públicas, concursos de ideias, etc.) à atividade municipal. Em razão da autonomia municipal é possível a mais diversa e plural forma de instituição destes instrumentos. Quanto maior e mais intensa for a sua utilização, maior a legitimidade do poder público.

A transparência radicaliza o princípio da publicidade, o dever de, não somente a disponibilização de todas as informações requeridas pelos cidadãos, em tempo útil, que não estejam classificadas como sigilosas, mas também o dever de uma transparência ativa, com a permanente divulgação – mormente com os sítios na internet – de informações essenciais para o controle social da máquina administrativa (contratos administrativos, estrutura e competências legais, editais, despesa pública em tempo real, entre outras). Esta dimensão entrelaça-se com a democracia participativa e com a responsabilização. Quanto maior o fluxo de informações aos cidadãos, maior a participação e o controle sobre os gestores e a máquina administrativa.

Por fim, a responsabilização ou accountability tem por pressuposto o dever de prestar contas de todos aqueles que fazem a gestão de recursos públicos, com base no controle da própria administração. Há a accountability vertical, que ocorre nos processos eleitorais, como também a accountability horizontal, que na ordem jurídica portuguesa tem por escopo os processos de controle interno e externo, este último da responsabilidade da Inspeção Geral de Finanças e do Tribunal de Contas.

A boa governança municipal pressupõe, assim, uma efetiva transparência quanto ao acesso às informações públicas; a utilização de instrumentos da democracia participativa a fim de conferir legitimidade às decisões governamentais; e a responsabilização ou accountability vertical e horizontal diante da gestão dos recursos públicos, concretizando, dessa forma, o direito a uma boa administração.

- 06 fev, 2023