Diretor: Vitor Aleixo
Ano: XII
Nº: 626

Este país não é para fracos Voltar

A vida percecionada através das redes sociais tem criado uma imagem do ser humano formatada. De um modo geral todos acabam por maquilhar, um pouco ou muito, a vida que apresentam nas redes sociais para que ela obedeça aos estereótipos a que nos fomos habituando sobre a pessoa feliz e bem-sucedida. E de que estereótipos falo eu?

Ora, apresentando-os em algumas linhas, para não roubar muito do vosso tempo, poderemos dizer que o ser humano feliz e bem-sucedido que nos apresentam hoje em dia um pouco por todo o lado é, antes de mais, alguém bonito ou que procura ser bonito. Quero com isso dizer que é alguém que pratica desporto, que cuida da sua saúde ao mesmo tempo que cuida do seu aspeto físico. Alguém que procura ter um bom emprego, que possui algum desafogo monetário. Alguém que está de bem com a vida porque gosta da vida que leva, tanto a nível profissional como a nível pessoal. Profissionalmente é alguém seguro, determinado, proativo, firme nas suas convicções, um líder nato, independente. Não são essas as características que quase todos procuram deixar passar sobre si quando se querem apresentar a nível profissional? E a nível pessoal? A esse nível gostam de mostrar a sua vida um tanto ou quanto maquilhada por uma felicidade constante, recheada de momentos felizes entre amigos e família, férias e divertimentos em locais vários e bonitos, onde servem pratos diferentes e saborosos (que não se esquecerão de fotografar). No fundo, e a ter em conta toda a informação que nos vai sendo veiculada pelas redes sociais, são pessoas inteiramente felizes e bem-sucedidas tanto a nível pessoal como profissional.

Mas…é claro que tinha de haver um más…todos nós sabemos que não existem vidas perfeitas, certo? Todos nós sabemos que a vida “maquilhada” apenas com bons momentos e felicidade não existe. É claro que a felicidade são momentos e não um continuum. Então, por que raio continuamos nós a querer mostrar tanta perfeição na nossa pessoa e na nossa vida? Por que raio queremos tanto esconder que todos nós temos momentos de maior vulnerabilidade e tristeza?

O facto é que se criou uma sociedade que não aceita o feio, o pouco esforçado, o fraco, o triste, o amargurado, aquele que se apresenta sem forças para se mostrar feliz. No fundo, a sociedade não aceita toda e qualquer pessoa que não caiba nos parâmetros estereotipados criados nas redes sociais. Estamos numa sociedade que não gosta de pessoas sem brilho, e, ainda que saibamos que elas existem, prefere que elas se mantenham na sombra e em silêncio.

Mas a verdade é que, na minha forma de ver as coisas, tal como não existem pessoas absolutamente e sempre felizes, também não existem pessoas sempre fracas, pouco resilientes e tristes. Há pessoas fracas, sim, mas apenas em certos momentos ou fases da sua vida. Pessoas que se sentem fracas quando a sua vida aparece pontuada por dificuldades e sofrimentos que, naturalmente, fazem parte da vida mas com os quais a pessoa não consegue lidar naquele momento. Todos nos podemos sentir frágeis e fracos num determinado momento. A todos isso acontece. E, pergunto eu, não teremos direito a isso? Não terá essa pessoa enfraquecida e fragilizada o direito de se sentir assim, de  falar sobre isso e de, de algum modo, viver a sua dor, até que a consiga superar?

Considero que esse é um direito inalienável. Contudo, nos dias de hoje, o que assistimos é que quem se sente fraco e sem forças irá procurar escondê-lo e esconder-se. Sabe que tal não será aceite pela sociedade e portanto irá continuar a maquilhar  a sua dor e o seu sofrimento de uma alegria que não existe, de uma felicidade que não se vive, a sentir-se o único ser neste mundo que não vê a vida da forma colorida que todos os outros parecem ver. E é nesse momento que se abate o peso da solidão sobre o ser que se sente completamente errado e cinzento num mundo carregado de cor e felicidade. Daí a necessidade de se esconder. Mas a esses, os que se sentem vulneráveis e fracos, digo em alta voz que a vulnerabilidade é apenas um estado do ser humano, tal como o é a felicidade. E digo que é um estado que se pode alterar. Como tal, há que aceitar a fraqueza e a fragilidade que existe em nós e ter força para não lhes sucumbir. Há que aceitar que temos momentos de maior tristeza e maior fraqueza, percebendo que não podemos estar sempre felizes mas também não podemos estar sempre tristes. Pensar que só sabemos o que é ser feliz, sentir-se forte e resiliente porque já aprendemos o que é sentir-se triste, fraco e sem forças. E, depois disso tudo, concluir que é sempre possível superar as nossa fragilidades e transformá-las em força e coragem para ultrapassar essa montanha que por momentos nos parece intransponível.

Há que assumi-lo: por mais que se tente maquilhar essa realidade, todos temos momentos de vulnerabilidade, de tristeza, momentos em que nos faltam as forças. Por isso, há que deixar de acreditar que este país não é para fracos e aceitarmo-nos e assumirmo-nos tal como somos: com forças e fraquezas, com momentos bons e outros menos bons. Com episódios coloridos, em certos momentos, e episódios cinzentos, em outros tantos. Há que assumir sem medos que nem sempre nos sentimos fortes e felizes. E assumi-lo, sem embaraços, perante todos. Deixarmo-nos de “maquilhar” de cores vivas a nossa vida só para parecer que somos iguais aos outros todos. E, por fim, há que acreditar, acima de tudo, que saberemos superar os momentos menos bons, que não nos deixaremos vergar pelas dores, fraquezas e vulnerabilidades. Afinal, aceitar a nossa vulnerabilidade como parte integrante do nosso ser será uma forma de, mais tarde, a transformar em força e coragem para superar as fragilidades. Será uma forma de superar os dias cinzentos e dar lugar aos dias coloridos.

Esta crónica foi-me inspirada por um grande amigo. Espero que estas minhas palavras lhe tragam alguma luz e cor aos pensamentos mais escuros que tem vindo a ter. “Das fraquezas fazer força” é o lema.

- 06 fev, 2023