Um Governo ele próprio desgovernado não consegue governar
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Doze demissões, entre Secretários de Estado e Ministros, no prazo tão curto de menos de um ano, é demasiado em quantidade e muito preocupante e grave no plano político para um Governo que recebeu do eleitorado um mandato tão claro expresso numa maioria absoluta, sem margem para dúvidas. E tudo isto acontece, está a acontecer, numa conjuntura internacional e nacional que não se compadece com situações como esta que, claramente, está, mais do que enfraquecer, a arriscar paralisar o País, com repercussões no presente mas também no futuro. Ou seja, quando era suposto termos um Governo que, de mangas arregaçadas, coeso, bem coordenado e sólido, estivesse a fazer o que se lhe exige que é pura e simplesmente governar e governar bem, eis que este é o panorama com que todos nos deparamos.
É muito o que se impõe fazer para enfrentar os também muitos problemas e desafios que Portugal enfrenta. Todos, praticamente, com impacto não só no presente mas também no futuro. Vejamos alguns dos mais importantes e prementes. Na Saúde, constatamos com preocupação as carências nos seus diversos sectores, com relevo para o sector das Urgências e para o problema dos médicos e enfermeiros e respetivas carreiras profissionais. De acordo com um Inquérito realizado junto de 1792 médicos pela respetiva Ordem, a conclusão principal é a de que, desde os médicos mais jovens aos mais idosos, o espírito reinante é claramente de desencanto e, sobretudo, de pessimismo quanto ao futuro do SNS. São conclusões que não podem deixar de nos preocupar a todos a começar no Governo. O que se impõe fazer na Saúde deve sê-lo para o presente mas sem perder de vista o futuro de um sector tão sensível da nossa Democracia. Mas como pode este Governo enfrentar esta realidade e estes desafios se ele próprio não resolve os que se passam no seu interior?
Na Educação, estamos, como é sabido, perante uma verdadeira crise estrutural e histórica: uma crise grassa principalmente no corpo docente, como evidencia o crescente abandono da profissão, quer por força das passagens à Reforma dos docentes mais experientes quer ainda pelo abandono de muitos dos mais jovens que não veem nas suas carreiras nada de promissor, quer no plano remuneratório quer no plano funcional. Falta uma verdadeira política de atração e de formação de qualidade de novos professores que rejuvenesça e valorize a classe e a prepare e envolva na educação e formação das jovens gerações.
Uma outra área problemática é a do futuro da Segurança Social, um sector que muito diz aos portugueses e sobretudo aos mais jovens que estão em início de carreira profissional e não sabem com o que podem contar quando chegarem à idade das suas Reformas. Parece que está criado pelo Governo um Grupo de Trabalho ao qual foi incumbido estudar a situação e apresentar propostas suscetíveis de garantir um futuro seguro a este sector tão sensível da nossa vida coletiva. Muitos são os jovens e suas famílias que emigram não apenas em busca de uma vida mais próspera mas tendo em vista garantirem uma vida boa nas suas velhices, o que significa que não depositam confiança no que por cá existe. Curiosamente, também aqui está em curso um Inquérito sobre o futuro da Segurança Social e em particular o das pensões de Reforma, num universo de inquiridos onde predominam – e bem – os mais jovens. Esperemos pelos resultados.
O PRR e os Fundos Estruturais 20/30 constituem a “Esperança de todas as Esperanças”! É a sina de Portugal e dos portugueses, esta de apostar todas as fichas nas ajudas financeiras vindas de fora – e já veio tanto desde os finais da década de 1980 que até já lhe perdemos a conta e as perdas! Como se o esforço maior, o esclarecimento e a mobilização da sociedade, o desenvolvimento cultural dos portugueses e a qualificação dos que trabalham, e, SOBRETUDO!, a transparência nos processos de Planeamento, a Execução criteriosa de tão elevados montantes que nos chegam e a Avaliação rigorosa dos resultados e seu impacto na vida económica e social do País não fossem a pedra de toque decisiva do nosso verdadeiro desenvolvimento. É de facto muito dinheiro que está em jogo. Mas, o que se poderá esperar destas verbas avultadíssimas se o Governo que é responsável pela sua aplicação e controlo está afetado, como se de uma verdadeira Pandemia se tratasse, por sucessivas paralisações de Ministérios, Ministros e Secretários de Estado? Como pode um Governo em situação permanente de desgoverno governar bem Portugal?
Aguardemos o futuro próximo, isto é, os próximos dias. Vai a pandemia de demissões e de discórdias intestinas constantes manter-se no interior do Governo? Claro que se deseja que não e essa tarefa só cabe ao Governo. E mais: este não pode acusar as oposições por este estado de coisas. Diz-se que a inflação a que estamos sujeitos vem de fora, dos circuitos internacionais, pelo menos uma parte. Mas, no que diz respeito a esta outra “inflação”, que é a das crises contínuas no Governo, que não venha este invocar essa exterioridade. Olhe para dentro de si.