Diretor: Vitor Aleixo
Ano: XI
Nº: 587

O politicamente correto Voltar

A sociedade que conhecemos convencionou, há muito, que as narrativas, conversas e expressões têm que estar alinhadas com o “politicamente correto.” Com estas “balizas”, validadas socialmente, a liberdade de expressão fica contida em linhas pré-estabelecidas. Ou seja, numa sociedade democrática tudo se pode dizer desde que seja politicamente correto. Esta realidade, como se sabe, não começa nem acaba na política. Entra nos domínios profissional, social, cultural e até familiar. Existe uma espécie de pacto invisível mas muito presente sobre o que se pode ou não dizer. Até a mentira é tolerada desde que seja para compor a verdade ou mesmo construir uma narrativa da pós-verdade que possa arrumar situações do momento que exigem explicações medianamente credíveis. Naturalmente, sempre existiram pessoas sem filtros que dizem o que querem, como e quando querem. Em função disso sofrem consequências e represálias. Muitas vezes ficam sós, isoladas, afastadas do carreiro onde seguem os outros que vão no caminho certo, lendo a cartilha de forma politicamente correta. As pessoas sem filtros são uma minoria. No entanto, os outros, a imensa maioria que tem filtros começa a dar sinais fortes de cansaço com o politicamente correto que, cada vez mais, se confunde com um exercício de hipocrisia de dimensão monumental. No fundo, as pessoas estão fartas desta convenção. Estão fartas da hipocrisia reinante. Começam a rejeitar os discursos redondos, arrumados e certinhos mas que não dizem coisa nenhuma. Estão fartas dos discursos que escondem a verdade e não colocam as cartas na mesa. Jogam por baixo do tabuleiro e dissimulam-se por trás dos biombos. Num tempo em que tudo muda a uma velocidade vertiginosa e a estabilidade que há muito conhecíamos se encontra cada vez mais abalada, precisamos de pilares fortes para nos agarrarmos com força em caso de tempestades mais do que previsíveis. Este tempo de metamorfose constante exige que se digam as coisas como são, com verdade, lisura e transparência. As ditaduras tiveram e têm um tempo. Uma a uma foram sendo derrubadas. Por isso, em democracia não podemos permitir que se instalem ditaduras consentidas por quase todos, como o totalitarismo do politicamente correto, que apenas serve alguns que giram à volta das plataformas de poder, públicas ou privadas. Temos que acabar com esta hipocrisia gelatinoso onde alguns se movimentam como peixe na água. O exercício da verdade diminui as geografias pantanosas. A transparência alarga todas as possibilidades mesmo que sejam as de uma realidade dura e difícil. A este propósito o psicólogo Jordan Peterson avisa-nos: “Existe um preço por falar a verdade. Falar nunca será seguro, mas o risco de não falar é tornarmo-nos num servo, um ressentido, um escravo sem poder e autoestima. É um preço muito mais alto.” É justamente para não pagarmos esse preço demasiado alto e sermos confrontados com essa ausência de autoestima que temos que arrepiar caminho, a começar pela exigência de respostas para as perguntas que fazemos com clareza. É preciso rompermos com esta hipocrisia monumental do politicamente correto que alimenta a tirania em territórios que apenas deviam amanhecer em verdadeira liberdade democrática. De um momento para o outro não precisamos de atuar como se não tivéssemos filtros. Precisamos apenas de ser firmes na defesa das nossas convicções e princípios, não deixando nada por dizer e sobretudo por fazer.

- 16 ago, 2022