Diretor: Vitor Aleixo
Ano: XI
Nº: 587

Guerra, diálogo e Paz Voltar

A 144ª Assembleia Geral da União Interparlamentar (UIP) que reuniu os parlamentos do mundo de 177 países, reuniu na Indonésia no fim de março.

Enquanto as Nações Unidas reúnem os governos das nações, a União Interparlamentar reúne os parlamentos do mundo. E é sem dúvida cada vez mais importante, reforçar a Democracia, numa época com tantas ameaças e os grassam os extremismos e nacionalismos. A promoção da Democracia e da Paz é o seu principal desígnio e uma tarefa exigente.

Participei nesta última reunião, enquanto vice-presidente da delegação portuguesa da Assembleia da República, missão que assumi com honra e sentido de responsabilidade até ao último minuto, enquanto deputada e enquanto representante eleita por Portugal. Para esta Assembleia tinha sido definido como tema principal, “o combate as alterações climáticas”. Objetivo que temos presente como importante e até urgente, a vários níveis.

Mas na realidade o tema que dominou esta Assembleia, foi, como não poderia deixar de ser, o item de urgência sobre a “situação da invasão da Ucrânia pela Rússia”.

O conselho diretivo da UIP, presidido pelo deputado Duarte Pacheco, já tinha aprovado uma declaração de forte condenação à Rússia e de solidariedade para com a Ucrânia. E isso mesmo foi transmitido, numa reunião que tivemos com Inna Ohnivets, Embaixadora da Ucrânia, onde tive a oportunidade de reafirmar, o nosso apoio e solidariedade para com este País soberano que foi invadido e que está sob um cruel ataque.

Contudo, apesar de não ser fácil, o nosso objetivo foi que nesta Assembleia Geral, se conseguisse uma declaração inequívoca, que reafirmasse os princípios da declaração da Carta das Nações Unidas, o cumprimento do direito internacional, e do respeito pela integridade territorial, defendendo-se uma resolução pacifica da guerra. Assim reafirmámos, enquanto parlamentares do mundo, a condenação desta invasão, que de modo algum é apenas um conflito.

Para isso, foi necessário que se obtivesse uma maioria clara, com dois terços de votos a favor. E mais uma vez, estiveram várias resoluções em cima da mesa, com nuances bem diferentes, e que para nós, deputadas e deputados de países onde as liberdades e democracias estão mais implementadas, só uma posição clara que reafirmasse a condenação da invasão e a solidariedade era viável.

Desenvolvemos um trabalho intenso, onde tive o gosto de participar, para que pudéssemos alcançar esse objetivo, e este trabalho decorreu em vários níveis, mas também em reuniões com outras configurações e conversas informais, que contribuíram para essas aproximações. Sabemos que na geopolítica as posições muitas vezes são complexas, e também neste quadro os representantes desses parlamentos acabam por refletir de alguma forma essas posições.

Antes da votação já tínhamos estado numa emocionante reunião, onde ouvimos a nossa colega deputada ucraniana, que preside ao Fórum das Mulheres, e que interveio a partir da Ucrânia, relatando o que se estava a passar e dando-nos conta da situação vivida por mulheres, famílias, e por milhares de refugiados, mas em que refirmou a luta política pelo seu país e a coragem no enfrentamento desta situação de guerra, que ataca alvos civis e dos perigos das famílias, que ouvimos de viva-voz. Neste fórum foi ainda dada a palavra a um representante da delegação russa, também via vídeo-conferência que defendeu uma posição diametralmente oposta, resumindo tudo à versão oficial, de mero conflito. Foi assegurada a apresentação das duas moções que iriam ser apresentadas a votação.

Esta votação que recebeu a grande maioria dos votos expressos num sistema de votação que tem em conta, vários critérios incluindo a população do país, o número de delegados presentes e o cumprimento das regras da representação de género, influenciando assim os votos atribuídos a cada delegação.

Conseguimos os dois terços e a resolução foi aprovada, o que para nós, parlamentares que defendemos de forma intransigente os direitos humanos, a Paz e a Democracia e Liberdade, revelou uma importante posição de afirmação das vozes dos parlamentares do mundo.

Neste fórum, o diálogo entre parlamentares é um dos meios essenciais de trabalho que temos de preservar e valorizar, e sem dúvida é o meio essencial quando queremos construir a Paz e acabar com a Guerra.

Realce ainda para a intervenção do Secretario Geral da ONU António Guterres com o constante apelo à Paz e ao imediato fim desta guerra.

No entanto e lamentavelmente, a cada dia que passa, tudo se tem agravado ao nível da destruição, dos ataques a alvos civis e de possíveis crimes de guerra e genocídio que têm mesmo de ser investigados e levados às instâncias próprias para julgamento e condenação destes atos bárbaros sobre populações civis, mulheres, crianças e idosos.

A construção da Paz é uma tarefa complexa, mas que desejamos intensamente. Não conseguimos deixar de sentir a dor e tristeza, por estas guerras incompreensíveis e inaceitáveis.

Mas, nesta que foi a minha última Assembleia Geral da União Interparlamentar e em simultâneo também o fim do meu trabalho parlamentar, tive ainda a oportunidade de fazer uma intervenção sobre o tema da saúde, fazendo o balanço e ponto da situação da resolução que apela a mais solidariedade na distribuição e acesso à vacinação para a Covid-19, que foi aprovada na anterior AG em Madrid e na qual também participei e intervim. Realcei, portanto, que Portugal tinha já doado até ao momento 7 milhões e meio de vacinas, superando em muito o objetivo inicial, tendo metade desse montante sido entregue aos países africanos de língua oficial português e a Timor-Leste. Apelei ao reforço efetivo desta cooperação ao nível da saúde mundial, dando como exemplo Portugal.

Não posso deixar de referir, a minha participação na Comissão do Médio Oriente, que acompanha e analisa os conflitos nesta região do globo, tendo aí assento as partes em conflito, sendo mesmo, por vezes, a única ponte de diálogo, como já aconteceu diversas circunstâncias no passado, entre Israel e a Palestina. Nesta reunião, foi feito o balanço da retoma das relações e diálogo, entre Israel e vários países, sendo que se registou a ausência dos representantes da Palestina.

Não pude deixar de manifestar o meu pesar a Israel pelos recentes atendados, que ocorreram, ainda no decurso desta Assembleia Geral e que lamentamos profundamente. Por vezes, a Paz é tão difícil de alcançar, que mesmo o caminho do diálogo doi.

Fizemos, como habitualmente a reunião com os países da CPLP, em que estiveram presentes, parlamentares de Cabo Verde, Angola, Moçambique, Timor-Leste, para alem de Portugal, em que um dos temas foi naturalmente a defesa da língua portuguesa e lembrei ainda, a boa articulação e espírito de união, que tivemos na defesa de um item de urgência para apoio e solidariedade com Moçambique aquando do furacão IDEA. Apelei a que essa união e concertação continuasse no futuro.

Deixo estas funções, com a consciência do dever realizado e a satisfação por ter feito, tudo ao meu alcance na representação de Portugal e do parlamento português e desta forma dignificando as funções, para as quais fui eleita, quer internamente, como nestes fóruns, quer pelos eleitores do Distrito de Castelo Branco.

Ao novo governo e a todos os que o integram, às novas e novos deputados eleitos desejo as maiores felicidades. Que continuem a luta, na qual me empenhei de forma intensa e dedicada.

Por Portugal e pelo Distrito de Castelo Branco. Obrigada!

 

Hortense Martins, Economista

- 29 abr, 2022