Diretor: Vitor Aleixo
Ano: XI
Nº: 587

O transporte público-pessoal versus o Autovoucher-Beira Interior Voltar

Os combustíveis estão a ultrapassar todos os recordes de preços. Quer se trate de gasolina, gasóleo ou gás, os valores não param de subir. É claro que às vezes descem uns cêntimos, mas ao longo do tempo a tendência é sempre de subida.

Já em novembro de 2021 os passes em Lisboa tinham sido congelados, precisamente porque a tendência da subida dos combustíveis, e os custos para as empresas de transportes, já se fazia notar. A associação ambientalista Zero propôs, em 19 de março deste ano, que os passes Navegante deviam passar a custar metade do preço. Na mesma altura propôs ainda a eliminação do Autovoucher, o único programa com que o governo tentou compensar parcialmente a subida dos preços da gasolina e do gasóleo.

A associação ambientalista Zero considera também que em lugar de aplicar o Autovoucher, o governo devia era usar esse dinheiro para diminuir ainda mais os passes nas duas grandes áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. Felizmente que o governo, provido de mais bom senso, resolveu manter o Autovoucher geral e adicionalmente congelar o aumento da taxa de carbono nos combustíveis, em mais 5 cêntimos, pelo menos até junho.

Ora, já dizia Descartes, o bom senso é a coisa do mundo mais bem distribuída, pois todos pensamos tê-lo em tal medida que até os mais difíceis de contentar, nas outras coisas, não costumam desejar mais bom senso do que aquele que têm. É precisamente o que se passa com esta visão do mundo baseada em transportes públicos, que é absolutamente impossível de aplicar em regiões de baixa densidade como é a nossa.

Na região da Beira Interior a densidade de população é baixa, pelo que não é possível ter a funcionar transportes públicos com frequências de 5 ou 10 minutos. Em qualquer das regiões metropolitanas se um cidadão perder um autocarro, um metro, ou comboio, basta-lhe esperar uns minutos pelo próximo. Na Beira Interior é absolutamente necessário usar o transporte público-pessoal! O reconhecimento deste estatuto, e desta necessidade, é precisamente o que algumas autarquias já fazem com o transporte social a pedido.

Em janeiro de 2008 o preço médio da gasolina simples 95 era de 1,387€ e, no dia em que escrevemos este texto, em 25 de março, o custo médio era de 2,017€. Ou seja, em apenas 14 anos o valor da gasolina subiu 45%! Já o passe Navegante tem passado os anos a ser subsidiado-congelado, e muito bem, custa 40€ por mês e permite viajar todos os dias nos transportes públicos da área metropolitana de Lisboa, a qual vai desde Vila Franca de Xira até Setúbal. O equivalente seria viajar por toda a Beira Interior, por 40€ por mês, com os milhares de frequências de autocarros, comboios e metro desta área metropolitana.

É claro que não é possível implementar milhares de frequências na Beira Interior, então é necessário reconhecer a existência, de facto, do transporte-público pessoal e implementar um Autovoucher-Beira Interior que permita aos habitantes recuperar o custo do combustível. Não devemos esquecer que o cidadão deste território tem de adquirir o seu próprio veículo para efetuar este transporte-público pessoal, enquanto na área metropolitana a aquisição dos veículos de transporte público é subsidiada pelo estado, além deste subvencionar em dezenas de milhar de euros os respetivos custos de funcionamento.

O governo encontrou uma forma funcional de compensar os cidadãos pelos custos do transporte, uma forma que identifica facilmente a área de residência fiscal do cidadão. É, portanto, muito fácil, assim haja vontade, de ativar um retorno extraordinário Autovoucher-Beira Interior para compensar os cidadãos que vivem neste território com o custo do combustível. A ideia é um bom teste à intenção de o governo continuar a compensar os custos de contexto de viver no interior em regiões de baixa densidade.

José Páscoa, Professor Universitário

- 08 abr, 2022