Diretor: Vitor Aleixo
Ano: XI
Nº: 587

O Ladoeiro subiu em campo e o centralismo não gostou Voltar

Quem assistiu ao playoff de subida à Liga Placard e a tudo o que se desenrolou a seguir, dificilmente ficou surpreendido se conhece bem o futsal português e os seus meandros. Não foi surpreendente o Ladoeiro sagrar-se campeão nacional e conquistar a subida. Quem conhece bem aquele grupo de trabalho, aquela crença que os levou dois anos seguidos até esta fase, a força que tem um grupo que é liderado por um jogador e um ser humano impressionante como é o Eskerda, sabe que estava destinado e que tinha de ser da forma mais poética e estoica possível e assim foi.

O Ladoeiro, orgulhoso “clube de bairro” de Idanha-a-Nova, é de uma freguesia que tinha em 2011 pouco mais de 1.200 habitantes. Terá agora em 2021 seguramente bem menos de 1.000 pessoas… E o centralismo do desporto nacional continua a odiar profundamente quem ousa sonhar em territórios como este. Não nos falem da ADF ou da Burinhosa como exemplos de sucesso das vossas provas inclusivas. São casos de sucesso e resiliência individuais dos próprios clubes que não desistem e batalham contra uma discriminação diária e constante. É mérito deles próprios, não vosso. O Ladoeiro, dizem as más-línguas com especial acentuação na palavra “más”, não vai subir à Liga Placard porque não cumpriu licenciamento/certificação. Não é porque deve salários a jogadores ou está em insolvência, algo a que se fechou os olhos durante anos e anos em clubes dos polos urbanos. É porque se esqueceu de um prazo de pagamento de uma burocracia sem sentido ou porque não é entidade formadora de 3 estrelas. Como se os clubes fossem hotéis ou estâncias de ski. Como se fosse correto, com regulamentos aprovados já no decorrer da época (espantem-se!), pedir a um clube de uma aldeia de Idanha-a-Nova ter todos os escalões de formação exatamente na mesma proporção do que se pede a um Benfica e Sporting. E dizem eles ser uma prova de oportunidades? Uma aldeia em Idanha-a-Nova com menos de 1.000 habitantes tem de encontrar jovens em todos os escalões? Tem de ser uma entidade formadora com estrelas dadas à pressão ou por especial favor? Estamos então a dizer que uma equipa de enorme qualidade do Interior do país, que tem 6/7 jogadores locais a brilhar ao mais alto nível do futsal nacional não pode sonhar? Pode ser melhor que todos em campo em seniores, mas não pode subir se não tiver juvenis ou iniciados? E eu a pensar que a qualidade de um grupo e a sua capacidade de estar no topo se media pelo que se fazia em campo e não por golpes de secretaria que beneficiam os mesmos de sempre: os clubes dos polos urbanos e das grandes densidades populacionais.

Espantam-se pois com o silêncio dos subservientes ao centralismo que por aqui vivem nas nossas bandas ou dos clubes localizados nas grandes urbes (é só olhar o mapa, são praticamente todos). Não se espantem. O futsal nacional, na falsa senda da profissionalização, continua a querer centralizar o desporto onde sempre quis. Nunca se esqueçam: Sameiro e Cariense ficaram a um ponto de clubes que foram a esta fase de acesso à Liga Placard. E em 3 meses numa só época passaram disso aos distritais. E ainda se vêm gabar dos seus maravilhosos regulamentos aprovados em cima do joelho? A Guarda não vai ter nenhuma equipa em provas nacionais porque depois disto ainda fazem Taças Nacionais em que os campeões distritais têm de ir para poderem chegar aos nacionais. Conseguiram o que queriam: retirar-nos de lá. Ou nos unimos ou estamos a ditar a nossa própria sentença. O Ladoeiro ganhou no único lugar onde era suposto: em campo. Aos que se diziam e achavam e que agora se gabam das 3 estrelas. Mas que acabaram com 3 golos (ou mais, muitos mais) dentro das redes. Acordem.

- 29 jun, 2021
- Fernando Gil Teixeira